Uma das cenas mais excitantes que me ocorria sempre, assim, quando pensava em cenas excitantes, claro – momentos não tão raros, mas alguns momentos, apenas –, era a de uma mulher lindíssima abraçando e beijando outro cara e, tipo, olhando pra mim, por cima do ombro ou da cabeça dele – enquanto ele, esse cara, tentava pegar os seios dela ou estava simplesmente dando um malho, como dizem. E ela olhava pra mim sem o tal cara perceber e eu ficava louco, porque ela tinha aquela cara sacana, sabe?
Tentando explicar o porquê dessa cena ser tão excitante, eu diria que tem a ver com uma quebra instantânea daquele mito besta de que mulher é diferente de homem nessas coisas. De que mulher, mesmo que de um modo geral, quando gosta de um sujeito não fica por aí lançando olhares lascivos a torto e a direito. Tem muita gente boa, inteligente, esclarecida que eu conheço que pensa isso de mulher. Bobagem, eu digo sempre. Elas ficam olhando sim. Igualzinho à gente.
Eu sei, e sou tão convicto ao dizer que o contrário é bobagem, porque constantemente eu via essa cena, interferia nela e me esbaldava, lá nos anos 80. Quase sempre que saía à noite, ia a uma festa ou a um bar ou mesmo quando andava pelas ruas, de dia, isso me acontecia. Estava eu lá, parado ou caminhando, passeando os olhos pelo ambiente, quando me deparava com um casal aparentemente apaixonado, dando aquele amasso e, também aparentemente, concentrado – ambos – no que estava fazendo.
Daí eu fazia de propósito! Parava e ficava olhando pra moça. Procurava um ângulo legal pra poder ficar em fogo cruzado com os olhos dela, caso eles encontrassem os meus, e também pra não dar tanto na cara assim, pro sujeito que dividia o momento com ela, que eu estava paquerando a mulher dele, ainda mais numa hora tão esquisita, não é?
E era batata! Ou quase, quase sempre. De cada dez vezes que fazia isso – mesmo eu não tendo anotado uma a uma, dá pra dizer assim, porque é importante citar números; as pessoas são tão bobas quanto a tudo, em sua maioria, que números as convencem, veja você... –, de cada dez vezes que fazia isso, em seis ou sete as mulheres correspondiam aos meus olhares. Sabe aquelas caras sacaninhas? Caras de mulheres sedentas por algo diferente...
Eu não era nenhum garanhão, não. Era um cara alto e coisa e tal, mas não tinha físico de atleta, e ostentava uns traços bastante comuns. Mas elas olhavam. Era como que se se sentissem poderosas ali, com os caras as beijando e um outro sujeito as cobiçando. Vaidade, eu pensava, às vezes. Mas a intensidade com que elas flertavam comigo era tanta que logo percebi que deveria ser algo mais. Vontade mesmo de estar comigo, um outro, enquanto sarravam com os namorados ou companheiros ou, assim, sei lá, os amantes delas.
E não foram raras também as vezes em que, enquanto elas beijavam os sujeitos, eu passava meu número de telefone, só mexendo a boca, como que pra elas fazerem leitura labial, ou mostrando os números com os dedos. Era engraçado. Mulheres, de um modo geral também, têm memória muito boa!
E se acumularam ocasiões em que acabei transando com elas, porque me ligaram e eu joguei aquela conversa mole, mas extremamente cativante, pras que topassem transar. É, acabei comendo essas mulheres, pensando naquelas caras lindas de sexo em estado bruto que elas faziam pra mim, quando estavam com os companheiros.
Foi brincando disso aí que conheci a Maíra.
Eu estava no auditório da Fafich, lotado de estudantes e desocupados. Haveria lá uma palestra sobre meio ambiente – assunto não muito comum naquela época, infelizmente – quando avistei aquela morena linda de pernas grossas, pelos louros nos braços e barriga malhada, calça justa e blusinha hering apertada com uma estampa do David Bowie, beijando um espinhento qualquer, na terceira fila. Parecia aluna de psicologia. Mas era de história.
Eu estava numa cadeira próxima, comentando com um colega que a audiência era grande naquela tarde, quando a vi. Ela e o namorado.
E pensei assim: vou ficar olhando pra ela, o ângulo está bom.
Maíra estava no colo do espinhento e ele lambia o pescoço ou a orelha dela, o rosto escondido naquela cabeleira negra brilhante que ela tinha. De olhos fechados, ela parecia muito excitada, mas caiu na besteira de abri-los – eram verdões – e mirá-los em mim. Eu sorri, juro, com um ar de inocência, por achar aquele sarro dela e do cara legal, por pensar “poxa, eles se amam”. Mas era só um teste.
Ela também escancarou um sorriso, só que bem diferente do meu, como eu esperava.
Maíra mostrava os dentes branquinhos e certinhos e apertava os músculos em volta dos olhos, que brilhavam pra mim, tanto quanto o sorriso. Da boca, saiu devagarinho a língua, que correu pelos lábios e os molhou, ela sempre com aquelas esmeraldas me dizendo algo como “eu quero você”. E o namorado lá, afogado nos cabelos dela.
Aí, claro, mudei meu jeito de sorrir. Cruzei as pernas – porque não me sentia mais à vontade perante os colegas, você entende –, e comecei a mandar mensagens mentais pra ela, sabe?
Com cara de degenerado, tipo.
A telepatia era mais ou menos assim: “Imagina minha língua nos seus pés, depois nas suas canelas, nas coxas, no colo, no umbigo e descendo de novo, depressa, pro seu baixo-ventre, enquanto minhas mãos nervosas apalpam você inteira e, no final, quando minha língua te invadir, agarram suas nádegas com força”.
Óbvio que não sou telepata, nem sei se isso existe, mas ela pareceu entender.
O trabalho do espinhento na orelha e pescoço dela também ajudava, claro, e eu via que Maíra delirava de prazer, sem tirar os olhos de mim.
Isso tudo durou alguns minutos e terminou com um grito escandaloso dela.
“Aaaaaaaaaai.”
Gozou, eu percebi.
O companheiro saiu do meio dos cabelos dela, assustado, viu que ela olhava pro lado e sorria pra alguém e virou-se. Eu desviei o olhar, que não sou bobo.
Quando a palestra começou, um dos caras convidados falava sobre uma fábrica de cimento perto de Beagá, sobre moradores da região que diziam estar ficando doentes com o pó que caía sobre suas casas e impregnava tudo, e Maíra, sentadinha agora ao lado do espinhento, não parava de lançar olhares com segundas intenções e de dar mexidinhas de nariz pra mim.
Fui esperto e me ofereci como voluntário, a pedido de um professor lá, não lembro qual, pra recolher perguntas em pedaços de papel e passá-los aos sujeitos da mesa. O dela foi o primeiro, com nome e o número do telefone. Ela me perguntava se eu queria namorar! Eu ri, meio sem graça, fazendo gênero.
Duas horas depois que a palestra havia terminado, eu liguei pra ela, de casa. Oi, eu disse, sou o sujeito da palestra de hoje e sim, eu quero. Daí saímos no dia seguinte, tomamos laranjada e comemos pães de queijo em uma lanchonete perto da Fafich mesmo, enquanto conversávamos sobre a vida.
No fim de semana seguinte, a gente transou. E ela superou as expectativas, sabe?
Foi, tipo assim, a mulher mais gostosa da minha vida.
Tentando explicar o porquê dessa cena ser tão excitante, eu diria que tem a ver com uma quebra instantânea daquele mito besta de que mulher é diferente de homem nessas coisas. De que mulher, mesmo que de um modo geral, quando gosta de um sujeito não fica por aí lançando olhares lascivos a torto e a direito. Tem muita gente boa, inteligente, esclarecida que eu conheço que pensa isso de mulher. Bobagem, eu digo sempre. Elas ficam olhando sim. Igualzinho à gente.
Eu sei, e sou tão convicto ao dizer que o contrário é bobagem, porque constantemente eu via essa cena, interferia nela e me esbaldava, lá nos anos 80. Quase sempre que saía à noite, ia a uma festa ou a um bar ou mesmo quando andava pelas ruas, de dia, isso me acontecia. Estava eu lá, parado ou caminhando, passeando os olhos pelo ambiente, quando me deparava com um casal aparentemente apaixonado, dando aquele amasso e, também aparentemente, concentrado – ambos – no que estava fazendo.
Daí eu fazia de propósito! Parava e ficava olhando pra moça. Procurava um ângulo legal pra poder ficar em fogo cruzado com os olhos dela, caso eles encontrassem os meus, e também pra não dar tanto na cara assim, pro sujeito que dividia o momento com ela, que eu estava paquerando a mulher dele, ainda mais numa hora tão esquisita, não é?
E era batata! Ou quase, quase sempre. De cada dez vezes que fazia isso – mesmo eu não tendo anotado uma a uma, dá pra dizer assim, porque é importante citar números; as pessoas são tão bobas quanto a tudo, em sua maioria, que números as convencem, veja você... –, de cada dez vezes que fazia isso, em seis ou sete as mulheres correspondiam aos meus olhares. Sabe aquelas caras sacaninhas? Caras de mulheres sedentas por algo diferente...
Eu não era nenhum garanhão, não. Era um cara alto e coisa e tal, mas não tinha físico de atleta, e ostentava uns traços bastante comuns. Mas elas olhavam. Era como que se se sentissem poderosas ali, com os caras as beijando e um outro sujeito as cobiçando. Vaidade, eu pensava, às vezes. Mas a intensidade com que elas flertavam comigo era tanta que logo percebi que deveria ser algo mais. Vontade mesmo de estar comigo, um outro, enquanto sarravam com os namorados ou companheiros ou, assim, sei lá, os amantes delas.
E não foram raras também as vezes em que, enquanto elas beijavam os sujeitos, eu passava meu número de telefone, só mexendo a boca, como que pra elas fazerem leitura labial, ou mostrando os números com os dedos. Era engraçado. Mulheres, de um modo geral também, têm memória muito boa!
E se acumularam ocasiões em que acabei transando com elas, porque me ligaram e eu joguei aquela conversa mole, mas extremamente cativante, pras que topassem transar. É, acabei comendo essas mulheres, pensando naquelas caras lindas de sexo em estado bruto que elas faziam pra mim, quando estavam com os companheiros.
Foi brincando disso aí que conheci a Maíra.
Eu estava no auditório da Fafich, lotado de estudantes e desocupados. Haveria lá uma palestra sobre meio ambiente – assunto não muito comum naquela época, infelizmente – quando avistei aquela morena linda de pernas grossas, pelos louros nos braços e barriga malhada, calça justa e blusinha hering apertada com uma estampa do David Bowie, beijando um espinhento qualquer, na terceira fila. Parecia aluna de psicologia. Mas era de história.
Eu estava numa cadeira próxima, comentando com um colega que a audiência era grande naquela tarde, quando a vi. Ela e o namorado.
E pensei assim: vou ficar olhando pra ela, o ângulo está bom.
Maíra estava no colo do espinhento e ele lambia o pescoço ou a orelha dela, o rosto escondido naquela cabeleira negra brilhante que ela tinha. De olhos fechados, ela parecia muito excitada, mas caiu na besteira de abri-los – eram verdões – e mirá-los em mim. Eu sorri, juro, com um ar de inocência, por achar aquele sarro dela e do cara legal, por pensar “poxa, eles se amam”. Mas era só um teste.
Ela também escancarou um sorriso, só que bem diferente do meu, como eu esperava.
Maíra mostrava os dentes branquinhos e certinhos e apertava os músculos em volta dos olhos, que brilhavam pra mim, tanto quanto o sorriso. Da boca, saiu devagarinho a língua, que correu pelos lábios e os molhou, ela sempre com aquelas esmeraldas me dizendo algo como “eu quero você”. E o namorado lá, afogado nos cabelos dela.
Aí, claro, mudei meu jeito de sorrir. Cruzei as pernas – porque não me sentia mais à vontade perante os colegas, você entende –, e comecei a mandar mensagens mentais pra ela, sabe?
Com cara de degenerado, tipo.
A telepatia era mais ou menos assim: “Imagina minha língua nos seus pés, depois nas suas canelas, nas coxas, no colo, no umbigo e descendo de novo, depressa, pro seu baixo-ventre, enquanto minhas mãos nervosas apalpam você inteira e, no final, quando minha língua te invadir, agarram suas nádegas com força”.
Óbvio que não sou telepata, nem sei se isso existe, mas ela pareceu entender.
O trabalho do espinhento na orelha e pescoço dela também ajudava, claro, e eu via que Maíra delirava de prazer, sem tirar os olhos de mim.
Isso tudo durou alguns minutos e terminou com um grito escandaloso dela.
“Aaaaaaaaaai.”
Gozou, eu percebi.
O companheiro saiu do meio dos cabelos dela, assustado, viu que ela olhava pro lado e sorria pra alguém e virou-se. Eu desviei o olhar, que não sou bobo.
Quando a palestra começou, um dos caras convidados falava sobre uma fábrica de cimento perto de Beagá, sobre moradores da região que diziam estar ficando doentes com o pó que caía sobre suas casas e impregnava tudo, e Maíra, sentadinha agora ao lado do espinhento, não parava de lançar olhares com segundas intenções e de dar mexidinhas de nariz pra mim.
Fui esperto e me ofereci como voluntário, a pedido de um professor lá, não lembro qual, pra recolher perguntas em pedaços de papel e passá-los aos sujeitos da mesa. O dela foi o primeiro, com nome e o número do telefone. Ela me perguntava se eu queria namorar! Eu ri, meio sem graça, fazendo gênero.
Duas horas depois que a palestra havia terminado, eu liguei pra ela, de casa. Oi, eu disse, sou o sujeito da palestra de hoje e sim, eu quero. Daí saímos no dia seguinte, tomamos laranjada e comemos pães de queijo em uma lanchonete perto da Fafich mesmo, enquanto conversávamos sobre a vida.
No fim de semana seguinte, a gente transou. E ela superou as expectativas, sabe?
Foi, tipo assim, a mulher mais gostosa da minha vida.
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