segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Gloriosa

Não é lenda.

A “vagina gloriosa” existe e um cara pode ter o privilégio de encontrá-la duas, três, até quatro vezes na vida. Mais que isso é exagero. Talvez até aconteça, mas, nesse caso, ou o sujeito é muito sortudo ou é daqueles que se fartam de mulheres sem muito critério, a ponto de não distinguir tipos de vaginas – o que, obviamente, obnubila o reconhecimento da gloriosa.

Experimentei o prazer, na ausência e na não necessidade de usar outra palavra, de ter com essas genitálias raras em duas ocasiões nos meus quase 30 anos de vida sexual ativa.

Ou seja, até agora.

Espero, ansiosamente, portanto, me defrontar com mais uma ou duas!

Mas vou contar como foi a primeira vez.

A mulher em questão é uma, digamos, artista. Uma alma boa e excêntrica mais velha que a minha uns duzentos anos, cujo corpo que habita também supera o meu em uns 15 anos.

Uma loba faminta, como ela mesma se definia.

(Cabe aqui um esclarecimento importante para a hermenêutica da vagina gloriosa: a mulher que a ostenta não precisa ser gostosa, linda, maravilhosa, nova, de meia idade, velha... Nada disso! Pode ser até um bucho, uma derrotada, uma fêmea aparentemente alijada do jogo do sexo. Não importa! O que importa é que, quando a gente adentra a cavidade esplendorosa dela, e ela, a mulher, deixa aflorar sua estonteante lubricidade e começa a operar um pequeno milagre no pau e no cérebro da gente, o mundo gira mais rápido, tanto que ganha novas cores e dimensões).

Mas a minha artista não era feia, não.

Pelo contrário: tinha um corpo bem feito e muito conservado, para a idade e em razão do fato de que tinha dois filhos bem grandinhos já. Era dona de traços finos e de uns olhos maravilhosos, levemente esverdeados e ensolarados, calmos como mar de almirante. Eu os descrevia para ela, também sem muita originalidade, mas com sinceridade, como “janelas de uma alma antiga”. Pareciam isso mesmo.

E a artista, paradoxalmente, apesar dessa espiritualidade toda que banhava o mundo através dos olhos, acabou revelando um furor sexual que me deixou quaaaase constrangido quando a gente transou.

***

Descobri que ela tinha uma vagina gloriosa logo no primeiro dia em que nos vimos!

Digo isso porque a gente começou a se seduzir bem antes, por mensagens.

Vale a pena contar, porque foi uma coisa curiosa: frequentávamos regularmente uma loja de aluguel de livros, na Savassi, em meados dos 80 – um tipo de empreendimento que, infelizmente, não existe mais. E percebemos ali, a princípio, que tínhamos o mesmo gosto literário. Baseados nisso, embora nossas visitas ao local nunca coincidissem, começamos a deixar papéis escritos à mão com pequenos textos nas páginas 69 dos livros, dirigidos a nós mesmos.

Claro, contávamos com a ajuda da dona da loja, que nos dizia que livro eu ou a artista havíamos alugado por último, e assim a gente podia trocar os bilhetes. Como o lugar era pouco movimentado, nunca houve confusão, do tipo meu papel ou o dela ser lido por outra pessoa.

Fato é que, pelo conteúdo que essa “conversa” foi adquirindo, logo surgiu entre a gente uma paixão fodida, um furacão de tesão e paudurescência, de joguinhos de frases inteligentes toma-e-volta, de declarações subliminares de amor kamassútrico até promessas explícitas de vou te foder toda, sua delícia, e de vou chupar você como nenhuma outra chupou, seu filho da puta.

Mensagem vai, mensagem vem, deu-se que marcamos um almoço.

Embora já a tivesse visto por fotos – chegamos a colocar fotos dentro nas páginas 69 dos livros – fiquei bastante impressionado com a aparição em três dimensões daquelas carnes.

E uma das coisas que mais me chamaram a atenção, além do bom estado geral para a idade, foram os cabelos encaracolados volumosos, de um vermelho gritante.

Com uma brancura britânica, daquelas que deixam à mostra as veias na tez pálida, ela me pareceu uma cópia da tal Boadiceia dos Icenos, a rainha guerreira ruiva, celta, de olhos doces e de espírito sábio, mas que emanava uma gigantesca e alucinante energia animal: garras de unhas negras e a voz grossa, que até hoje retumba na minha cabeça, de uma leoa que pode ser bem malvada quando o assunto é a alcateia – grupo do qual, aparentemente, eu começaria a fazer parte.

O perfume da minha artista (Floratta, eu descobri depois) e a minissaia diminuta e pouco apropriada para uma mulher de quase 40 anos, conforme a elucubração idiota que fiz no momento em que a vi, também me tiraram do sério.

“Nuh”, eu disse, alumbrado, no restaurante.

E ela sorriu, enlevada, os olhos quase revirando, porque o meu “Nuh”, uma espécie de interjeição de arrebatamento que me era bem característica nas mensagens enfiadas nas páginas 69 dos livros, a deixava louca de tesão.

Depois do almoço, um filé de frango meio sem graça com purê, arroz e salada, corremos para um motel, na BR-040, saída para o Rio de Janeiro.

Além da vagina gloriosa, ela tinha carro!!!

Chegando lá, foi aquela história: primeira trepada, ambos nervosos, sem saber como começar. Mas, passados uns cinco minutos de beijos desajeitados, saquei que a artista era uma artista ali na cama também.

No sexo oral com o qual ela me presenteou, os lábios dela, firmes, empurravam a pele do meu pau e deixavam à mostra a glande, que ela acariciava com a língua macia que parecia até bifurcada, tamanha a precisão e a variedade dos movimentos; depois, com a mesma pegada forte dos lábios, ela trazia a pele de volta ao topo. E fez isso inúmeras vezes, para cima e para baixo, sempre salivando e gemendo.

Eu mal sabia que o melhor, se era possível, ainda viria.

E veio.

Depois de alguns minutos de um prazer sem igual, ela ergueu a cabeça, fogo nos olhos, as narinas dilatadas, e, com o corpo suado, escorregou em direção ao meu rosto. A vagina gloriosa, que eu ainda não sabia que era gloriosa, foi pressionada na minha perna no trajeto e deixou um rastro molhado e deliciosamente quente.

Ela me deu uma lambida não muito demorada na boca e, para minha surpresa, continuou a escalada, apoiando as mãos na cabeceira da cama. Os seios grandes e brancos rasparam meu queixo, seguidos pela barriga proeminente, mas lindinha, que passou a curta distância dos meus olhos. E, finalmente, a vagina, que também me untara o peito, estacionou sobre os meus lábios.

Beija!, ela disse.

Fiz o que ela pediu sem pestanejar: um beijo apaixonado, a língua retorcendo na cavidade morna e cheirosa que ela me oferecia. A gloriosa, juro, parecia outra boca, encharcada, contraindo-se, pulsando, sugando e apertando meus lábios, enquanto ela rebolava e gritava de prazer, encaixada em meu rosto.

Eu estava quase no Nirvana quando ela ergueu o colo e o recuou, descendo de mim, claramente pronta para a penetração. Antes daquele momento, que seria uma espécie de acontecimento divino, a artista lambeu minha boca e minhas bochechas, impregnadas do sabor da gloriosa, com tanta volúpia que chegou a me morder.

Ela abandonou lentamente minha boca, como se não houvesse mais o que sorver ali, e olhou fundo nos meus olhos, dessa vez com um brilho de doçura.

“Você está preparado?”, perguntou, um tanto solene.

“Deus, mas é claro!”, pensei. “O que essa moça está pensando?”.

Seria ela a portadora de uma vagina dentada, mito presente em um dos livros que alugáramos na tal loja em que havíamos nos conhecido – “A Grande Arte”, de Rubem Fonseca –, ou algo do gênero?

Assenti, sem que houvesse de minha parte uma expectativa diferente da que se tem quando se está prestes a penetrar qualquer mulher que desperta a libido.

“Ah, seu incauto”, costumo dizer a mim mesmo, hoje.

O que seria uma transa fascinante, sem dúvida, transformou-se numa viagem alucinada e sem precedentes. Inesquecível.

Entrar na vagina gloriosa foi difícil: era muito apertada.

Mas sair dali foi muito mais.

Mais tarde, a artista me confessou que era praticante de pompoarismo, o que favorecia seu desempenho. Mas nem isso explicava a montanha russa em que meu pau e meu cérebro passearam.

Foram poucos minutos, admito, mas pareceu uma bela e eletrizante eternidade: o sincronismo e a orquestração do músculos vaginais, a mucosa ao mesmo tempo contritora e escorregadia, engolindo e mastigando meu pinto com um misto de força e delicadeza; a contenção mágica do nosso orgasmo simultâneo – ela parecia sentir a aproximação do êxtase e fazia um movimento que impedia nossa explosão –; a prolongação aparentemente infinita do prazer.

Depois dessa primeira transa, repetimos a dose em mais cinco ou seis ocasiões.

E nunca mais nos vimos.

Mas comecei ali minha conta de vezes em que tive com as gloriosas. A segunda, conto outra hora. A terceira e, Deus queira, a quarta, também relatarei.

Eu juro.

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